sábado, 30 de novembro de 2013

Sem vergonha de errar

Da cultura chinesa também vem o livro Grito de guerra da mãe-tigre, lançado mundialmente em 2011, pela escritora Amy Chua. Ela afirma que os filhos devem participar apenas de brincadeiras competitivas – e ganhar. Manifestações de afeto com as crianças, diz, esvaziam a autoridade dos pais. Tudo isso parece radical? Saiba que o estranhamento é cada vez menor. Para atrair alunos do ensino fundamental, com menos de 10 anos, escolas particulares no Brasil afirmam “preparar para o mercado”. Segundo a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, o número de operações estéticas em adolescentes de 14 a 18 anos cresceu 141%, entre 2008 e 2012. Os procedimentos mais procurados são lipoaspiração e implante de silicone nos seios.

Livros de autoajuda têm seu papel nesse culto à perfeição. As prateleiras de livrarias estão repletas de títulos que prometem tornar seus leitores mais bem-sucedidos, mais ricos, mais perfeitos e, portanto, mais felizes. Corrigir a linguagem corporal, curar a timidez, falar melhor em público, eliminar preo­cupações, aumentar a produtividade, acumular fortunas. Pense em qualquer desejo: há dezenas de autores capazes de oferecer uma maneira perfeita de satisfazê-lo e de apontar os erros que o impedem de chegar lá. O filme O segredo e o livro homônimo, ambos de 2006, são os maiores representantes dessa corrente. Para atrair o sucesso em qualquer área da vida, segundo eles, basta pensar positivamente e imaginar seu sonho concretizado. O livro vendeu mais de 20 milhões de cópias no mundo todo, e o filme faturou cerca de US$ 300 milhões. Ao menos os sonhos da autora, Rhonda Byrne, foram realizados. Para os leitores, a compra muito provavelmente não deu tão certo. O sucesso da autoajuda entre leitores do mundo todo é, paradoxalmente, uma prova de que os livros do gênero fracassam em sua meta de conduzir os leitores à vida perfeita. No mercado editorial americano, tornou-se conhecida a infame regra dos 18 meses: o cliente mais propenso a comprar um livro de autoajuda é aquele que comprou um livro do gênero um ano e meio atrás – e continuou cheio de problemas para resolver.

Não deixa de ser curioso, portanto, o surgimento agora de livros de autoajuda dedicados a cultivar a imperfeição. Ex-gerente de telecomunicações perfeccionista que largou a carreira para tornar-se doutora em serviço social, Brené Brown é expoente de um grupo de autores. Em seu livro The antidote: happiness for people who can’t stand positive thinking (O antídoto: felicidade para pessoas que não aguentam pensamento positivo), o americano Oliver Burkeman sugere que o segredo para evitar a frustração é aceitar as falhas e pensar que o pior pode acontecer. Antifragile: things we gain from desorder (algo como Antifrágil: coisas que ganhamos com o transtorno), do estatístico Nassim Nicholas Taleb, afirma que pessoas e organizações com maior tolerância a falhas e ao caos têm maiores chances de sucesso. EmErros incríveis, Paul Schoemaker, professor da escola de negócios Wharton, da Universidade da Pensilvânia, afirma que muitas das principais descobertas na história da ciência e dos negócios foram causadas por erros. Nas palavras do genial escritor irlandês James Joyce, “os erros são os portais da descoberta”.
 

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